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1º) O primeiro conceito a ser apontado na área de Relações Internacionais é o do espaçono qual ocorrem as interações sociais mencionados por Braillard, o do Sistema InternacionalOutros termos que podem ser indicados como sinônimos de SI são cenário e ambiente. Sua característica básica é a anarquia, representada pela ausência de um governo ou leis que estabeleçam parâmetros regulatórios para estas relações, em contraposição ao sistema doméstico dos Estados.

2º) A partir deste princípio básico, a ordem internacional é definida por meio dos intercâmbios e choques que se estabelecem entre os atores da política internacional. O ponto de partida desta visão clássica é o surgimento do Estado Moderno e a Paz de Westphalia em 1648 (o outro marco é o Tratado de Utrecht, 1713)

3º) Avaliando o SI a partir desta visão (visão de Braillard), três características definem este ambiente:

  • Sua dimensão global e fechada, resultante do processo de expansão do mundo ocidental iniciada pelas potências portuguesas e espanhola nos séculos XV e que atingiu no século XX o limite de todos os fluxos e Estados que compõem o SI
  • A heterogeneidade que corresponde às diferenças entre os atores que ocupam o espaço internacional, a diversidade destes mesmos atores (Estados, OIGs e FTs) e dos fenômenos que ocorrem no ambiente global (igualmente conhecidas como forças que se subdividem em naturais, demográficas, econômicas, tecnológicas e ideológicas)
  • A estrutura, que representa a ordem do SI, ou seja, o Equilíbrio de Poder (EP) que se estabelece entre os Estados e define uma hierarquia.

4º) Em termos teóricos, o Equilíbrio de Poder é um dos principais pilares da teoria realista clássica das Relações Internacionais do século XX. Suas origens podem ser encontradas nas dimensões práticas das relações intra-europeia dos séculos XVII a XIX, sendo o Concerto Europeu estabelecido no pós-Congresso de Viena considerado o “tipo ideal” deste modelo. Mas, em que consiste o EP e qual sua importância para as Relações Internacionais?

5º) Os Estados não possuem nenhuma autoridade acima da sua para regular suas relações no cenário internacional, cujo princípio central é a anarquia. O âmbiente externo não possui princípios organizadores, assemelhando-se ao Estado de Natureza de Thomas Hobbes.

6º) A ordem internacional emerge a partir da dinâmica de competição e choque mútuo entre os Estados que se anulam mutuamente ao perseguir seus interesses nacionais (a razão de Estado orienta o seu comportamento). A “prioridade primeira” é a manutenção da soberania e da segurança de cada unidade política individual.

7º) Este processo de contenção e dissuasão mútuas entre os diferentes pólos produz uma condição de estabilidade que se não satisfaz plenamente a todas as nações, evita a eclosão constante de guerras e o extremo dos jogos de soma zero. Neste contexto, tais relações ocorrem sob a “sombra da guerra” e visam a estabilidade de não a paz, percebida como um objetivo utópico. Com o surgimento da arma nuclear, estes equilíbrios se tornaram mais sensíveis, dado o poder de destruição mútua assegurada desta tecnologia. Raymond Aron faz o uso do termo “Equilíbrio do Terror” que simboliza a possibilidade da política voltar a ser um jogo de soma zero e o congelamento do poder mundial por aqueles que detém esta tecnologia.

8º) Ao longo da história, três tipos de ordem podem ser encontradas:

  • A unipolar, com proeminência de um pólo de poder (Império Romano)
  • A bipolar, com a existência de dois pólos principais (Guerra Fria 1947/1989)
  • A multipolar, composta por diferentes pólos.

Como indicado, o “tipo ideal do EP” foi o Concerto Europeu de 1815 a 1914, composto pelos pólos França, Grã-Bretanha, Prússia (Alemanha depois de 1870), Rússia e Império Austro-Húngaro. No pós-Guerra Fria, observam-se articulações complexas entre os modelos uni e multipolar.

9º) Atores que interagem em seu ambiente

10º) Estados – Unidades políticas centralizadas surgidas a partir da Paz de Westphaliaem 1648, contrapondo-se às instâncias fragmentadas e não seculares da Idade Média. Os princípios básicos do Estado Moderno são:

  • Territorialidade com base em fronteiras definidas
  • Soberania política sobre este território, constituindo um governo organizado
  • Existência de uma população que habita este espaço geográfico

11º) Juridicamente, os Estados reconhecem-se mutuamente, respeitando seus limites territoriais (respeito aos princípios de não intervenção e não ingerência), e estabelecem relações diplomáticas entre si. Todos os Estados são, portanto, soberanos dentro de sue determinado território. Em síntese, três componentes materiais compõem estas unidades políticas:

  • Território
  • População
  • Governo

12º) Ainda que os Estados sejam iguais de direito, não o são de fato. As diferenças referem-se a suas histórias (processos de construção e idade como Estados Westphalianos), constituições domésticas (regimes, formas de governos e dinâmicas dos atores da sociedade civil) e a seus recursos de poder. À medida que o poder é um elemento essencial da política (seja ela doméstica ou internacional), a posse destes recursos por um determinado Estado delimita sua capacidade de atuação e projeção no sistema e sua medida de vulnerabilidade. Estes elementos correspondem ao nível de autonomia.

13º) A análise dos recursos de poder à disposição do Estado deve levar em conta duas dimensões, a da posse e a da conversão dos recursos. A partir desta premissa é preciso fazer a distinção entre o poder potencial de um Estado, aquele que existe em suacondição bruta, e o seu poder real, definido por sua capacidade de conversão.

14º) Outra distinção a ser realizada quanto ao pode refere-se à tipologia dos recursos: o poder duro (hard power) e o poder brando e de cooptação (soft and cooptive power). O poder duro corresponde aos recursos de caráter tradicional: dimensões territoriais, posicionamento geográfico, clima, demografia, capacidade industrial instalada, disponibilidade de matérias-primas e status militar.

15º) Por sua vez, o poder brando e de cooptação refere-se às fontes de poder econômicas, ideológicas, tecnológicas e culturais que correspondem à capacidade de adaptação, flexibilidade e convencimento de um determinado Estado sobre seus pares. A habilidade política, da disseminação de valores e de produção de modos de vida (modelos ideológicos) inserem-se neste dimensão.

16º) Tendo como base estes recursos, algumas categorias de Estado podem ser identificadas:

  • Superpotências ou Potências Globais, que detém recursos nestes dois níveis, exercendo e projetando seu poder de forma multidimensional em nível mundial, o que lhes capacita ao exercício da hegemonia  O grau de autonomia é elevado, mesmo que estas nações eventualmente possuem vulnerabilidades específicas (como os EUA e o petróleo). Os recursos brando e duro são utilizados de forma alternada, ou simultânea, para a realização de seus interesses nas relações estatais e não estatais.
  • Potências Regionais, com capacidade para ação em nível regional em suas respectivas esferas de influência, com menor disponibilidade de recursos que as nações de projeção global. Sua presença é definidora do equilíbrio ou do desiquilíbrio em seu espaço geográfico (Estados pivô). Detém quantidade razoável de poder brando e duro, mas com deficiências de capacitação em algumas áreas. Pode-se inserir uma definição adicional neste grupo, identificando potências regionais localizadas no mundo desenvolvido e nas nações em desenvolvimento.
  • As nações em desenvolvimento do Sul, classificações alternativas são as de Grandes Estados Periféricos, Potências Médias e Países Emergentes. Estes Estados possuem características paradoxais: ao mesmo tempo em que detém quantidade significativa de recurso de poder duro, sua capacitação branda ainda apresenta vulnerabilidades. As nações mais pobres também são conhecidas por Países de Menor Desenvolvimento Relativo.
  • Papel Local/Restrito – Países de baixa projeção global e regional, cujas políticas externas tradicionalmente são satélites destes outros níveis e que exercem um papel limitado, restrito a seu espaço físico. Duas categorias podem ser identificadas: a dos países menores e estabilizados, como o Chile e a de Estados menos desenvolvidos e com elevada vulnerabilidade, vide o Haiti.

17º) Os Estados não são os únicos atores das Relações Internacionais, apesar de serem os principais. O campo dos atores não estatais divide-se em Organizações Internacionais Governamentais e Forças Transnacionais

18º) Organizações Internacionais Governamentais ou Intergovernamentaisreferem-se aos grupos políticos formados por Estados que ganharam impulso a partir de 1945 no encerramento da Segunda Guerra Mundial. Seu antecedente contemporâneo foi a Liga das Nações proposta pelo Tratado de Versalhes a partir dos Quatorze Pontos de Wilson.

19º) As OIGs surgem como espaços de negociação diplomática e construção de consensos, estabelecendo relações diretas entre os Estados que facilitem a mediação de suas relações, a cooperação e a perseguição de objetivos comuns. Estes fóruns multilaterais permitem o aumento dos contatos entre as unidades de políticas e canais alternativos de ação. As OIGs atuam em dimensões diversas da política internacional, dividindo-se segundo seu propósitos e extensão (esfera de ação, membros e dimensão: as de Propósito Abrangente (PA) e as de Propósito Único (PU) e as Globais e Regionais:

  • A ONU é de PA global. UE e Mercosul são de PA regional.
  • O FMI e a OMC são OIs de PU global. OTAN é de PU regional

20º) Formada por Estados, as OI possuem uma relação complexa e paradoxal com seus membros fundadores. À medida que se comprometem com as OIs, os Estados concordam em abrir mão de parte de sua soberania e a respeitar a Carta/Tratado que constituem estas instituições. Com isso, as OIs ganham autonomia para discutir e propor políticas, fortalecendo seu papel como fórum de negociação e tomada de decisões.

21º) O poder das OIs não se sobrepõe à soberania dos Estados, o que gera, por vezes, desrespeito a suas decisões e prescrições. Não são inéditas as oportunidades nas quais os países alegam questões de segurança e interesse nacional para ultrapassar o âmbito multilateral e agir individualmente.

22º) É preciso igualmente fazer uma distinção entre as perspectivas que os Estados de diferentes portes trazem para o âmbito multilateral. Para as nações menores, as OIs são elementos essenciais de ação, uma vez que o multilateralismo permite uma atuação mais equilibrada e equitativa no sistema internacional diante das nações mais fortes e permite a inserção de demandas e reivindicações nestes espaços. Para os Estados com mais recursos, além de funcionarem como canais diplomáticos, as OIs podem ser criticamente percebidas como meios alternativos de pressão e exercício de poder.

23º) Forças Transnacionais – Pertencentes à categoria dos atores não-estatais, as FTs diferenciam-se das OIs por representarem fluxos privados múltiplos ligados à sociedade civil (comunicações, transportes, finanças e pessoas) que afetam a política dos Estados tanto positiva, quanto negativamente. As ONGs, as Multinacionais, os Grupos Diversos da sociedade civil e, por fim, a Opinião Pública Internacional representam as FTs.

24º) É preciso discutir o papel das Forças Internacionais, também chamados de fatores ou acontecimentos, e que correspondem a ações dos agentes internacionais e a fenômenos que independem de sua decisão. Cinco forças podem ser citadas: a natural, a demográfica, a econômica, a tecnológica e a ideológica. Os elementos natural e demográfico correspondem a dimensões de poder duro, enquanto as seguintes referem-se ao brando:

  • força natural corresponde aos elementos geográficos, climáticos e de recursos/matérias-primas. Ainda que os desenvolvimentos tecnológicos tenham permitido aos homens melhor administrar estes fatores naturais ao longo dos séculos, muitos fenômenos continuam não dependendo das ações humanas como terremotos e desastres naturais similares. A temática ambiental relaciona-se à maneira como as sociedades relacionam-se com a natureza, gerando efeitos positivos (irrigação em terras de deserto) ou negativos (aquecimento global).
  • O fator demográfico refere-se aos impactos populacionais. Os principais componentes relacionados a este tema são crescimento populacional e os deslocamentos (migrações). Atualmente, enquanto algumas nações continuam sofrendo problemas relativos à explosão demográfica e controle de natalidade no Terceiro Mundo, e os países do Norte apresentam índices de crescimento negativo (e mesmo algumas potências médias como o Brasil também observam declínio populacional e envelhecimento). Fluxo de migração Sul-Norte e os temas de saúde (HIV, epidemias de gripe) também se inserem neste conjunto de preocupações.
  • A terceira força, o fator técnico ou tecnológico, é representado pelo campos da inovações tecnológicas, que ao longo da história do sistema internacional, permitiu às sociedades que tomaram à frente destes processos alçarem posições de destaque no equilíbrio de poder mundial. O fator tecnológico impacta diretamente as relações sociais, os modos de vida e os meios de vida e os meios de produção, apresentando profunda interdependência com a força econômica que delimita o progresso e as riquezas.
  • O fator econômico influencia as esferas sociais, produtivas, ideológicas e culturais das sociedades modernas, resultando em diferentes formas de divisão de trabalho no cenário global e na separação interna das classes dependendo do modelo adotado. Os dois principais modelos que dominaram o século XX, capitalismo e socialismo, tinham algumas variações. O Capitalismo de Estado adotado na Ásia e as sociais-democracias na Europa. No Socialismo, tivemos o modelo soviético e o modelo chinês.